Martins, o Gentil
De como os chatos são intoleráveis
Em primeiro lugar, gostaria de deixar claro que me identifico bastante com o nome do Dr. Gentil Martins. Não só por Martins ser o meu sobrenome, mas também por apreciar a gentileza de trato de uma forma geral.
E, em boa verdade, Gentil Martins é a personalidade mais boazinha da nossa praça: aparece em todos os programas dando o exemplo de um velhinho agradável e bem-educado, de senhor respeitável e honesto, de marido respeitador e pai extremoso, de homem regrado e saudável; um herói estóico, um modelo para todos nós.
No entanto, apesar de não se lhe poder apontar uma só mácula, o Dr. Gentil Martins, eminente cardiologista, não pode ser figura do meu agrado. Perdoe-me essa sumidade, mas não o suporto nem por nada.
É isso mesmo: não quero ser como o Gentil Martins. Não quero ser o Nuno Rogeiro do anti tabagismo, não quero ser o Maestro Vitorino da roda dos alimentos. Não!
E digo-lho a si, Doutor – não vou deixar de fumar por me aparecer em casa, na programação vespertina da televisão, a enumerar-me os malefícios do tabaco.
Não, não vou começar a beber leite Pleno só porque o Dr. mo aconselha num anúncio, com uma voz angelical, enquanto almoço.
Não, Shôtor, nunca vou ter um organismo impecável como o seu, só porque, no Telejornal, Sua Reverência me garante que nunca bebeu um copo, que faz da roda dos alimentos a sua Bíblia Sagrada e que, por isso, é mais feliz do que eu.
E NÃO, não vou começar a fazer jogging todo o santo dia, só porque o Sr., cheio de alegria, me diz que vou viver mais uma mão cheia de anos se o fizer.
Desculpe, Dr., mas não acredito em si.
Não, não vale a pena descrever-me a sua radiante alegria de viver. É escusado, não acredito em si.
Na verdade, nem sequer gosto de si.
Meu Deus, como o detesto.
Largue-me, não me mostre o seu diploma. Não quero ver a sua assinatura por baixo do Juramento de Hipócrates.
Não mo mostre, é claro que o Dr. é contra o aborto. Já o sabia.
Tu és previsível, pá!
Previsível e enfadonho. Oh, como és chato.
Larga-me, não me digas que defendes a vida. A tua vida é tão entediante que dela não esperas mais do que longevidade, extensão.
Ai não sabias que a vida podia ser melhor com um ou dois viciozinhos? Vá, experimenta, meu palerma.
Não, já sei. És muito perfeitinho para ser feliz. És um caso perdido. És um triste. Estás condenado, deixa lá. Puxa o lustro ao teu diploma, opera-te a ti próprio, aparece na TV. Sorri com moderação.
Nunca vais deixar de ser uma sombra. Insuportável e irremediavelmente chato.
E, em boa verdade, Gentil Martins é a personalidade mais boazinha da nossa praça: aparece em todos os programas dando o exemplo de um velhinho agradável e bem-educado, de senhor respeitável e honesto, de marido respeitador e pai extremoso, de homem regrado e saudável; um herói estóico, um modelo para todos nós.
No entanto, apesar de não se lhe poder apontar uma só mácula, o Dr. Gentil Martins, eminente cardiologista, não pode ser figura do meu agrado. Perdoe-me essa sumidade, mas não o suporto nem por nada.
É isso mesmo: não quero ser como o Gentil Martins. Não quero ser o Nuno Rogeiro do anti tabagismo, não quero ser o Maestro Vitorino da roda dos alimentos. Não!
E digo-lho a si, Doutor – não vou deixar de fumar por me aparecer em casa, na programação vespertina da televisão, a enumerar-me os malefícios do tabaco.
Não, não vou começar a beber leite Pleno só porque o Dr. mo aconselha num anúncio, com uma voz angelical, enquanto almoço.
Não, Shôtor, nunca vou ter um organismo impecável como o seu, só porque, no Telejornal, Sua Reverência me garante que nunca bebeu um copo, que faz da roda dos alimentos a sua Bíblia Sagrada e que, por isso, é mais feliz do que eu.
E NÃO, não vou começar a fazer jogging todo o santo dia, só porque o Sr., cheio de alegria, me diz que vou viver mais uma mão cheia de anos se o fizer.
Desculpe, Dr., mas não acredito em si.
Não, não vale a pena descrever-me a sua radiante alegria de viver. É escusado, não acredito em si.
Na verdade, nem sequer gosto de si.
Meu Deus, como o detesto.
Largue-me, não me mostre o seu diploma. Não quero ver a sua assinatura por baixo do Juramento de Hipócrates.
Não mo mostre, é claro que o Dr. é contra o aborto. Já o sabia.
Tu és previsível, pá!
Previsível e enfadonho. Oh, como és chato.
Larga-me, não me digas que defendes a vida. A tua vida é tão entediante que dela não esperas mais do que longevidade, extensão.
Ai não sabias que a vida podia ser melhor com um ou dois viciozinhos? Vá, experimenta, meu palerma.
Não, já sei. És muito perfeitinho para ser feliz. És um caso perdido. És um triste. Estás condenado, deixa lá. Puxa o lustro ao teu diploma, opera-te a ti próprio, aparece na TV. Sorri com moderação.
Nunca vais deixar de ser uma sombra. Insuportável e irremediavelmente chato.